A PATERNIDADE AFETIVA E EDUCATIVA DE JOSÉ (Curso de Josefologia - Parte II - Capítulo 21)


            Jesus na agonia do Getsemâni dirigiu-se ao Pai com a palavra “Abba”, conforme nos relata Marcos (14-36), ou seja, com a mesma forma aramaica com que as crianças se dirigiam aos seus pais;  fórmula esta que eqüivale ao nosso “papai”, e que Jesus a utilizou em seu âmbito familiar para com José, pois de fato a própria sua mãe testemunha isso quando disse-lhe: “Teu pai e eu estávamos angustiados à tua procura” (Lc 2,48). São José, foi portanto, na terra, o único homem afortunado de ter a singularíssima honra de condividir com Deus Pai, a idêntica inovação filial de Jesus.
José acolheu Jesus na sua casa, não apenas juridicamente, mas muito mais o acolheu afetivamente, considerando-o e amando-o como Filho. Os sentimentos de José para com Jesus são expressões genuínas de um amor autenticamente paterno, pois José exerceu para com ele a função de pai convivendo com ele, abraçando-o beijando-o e nutrindo-o com  paterno afeto (Pio IX, Decreto Quamdmodum Deus). “Ele teve para com Jesus por um especial dom celeste, todo o amor natural, toda a afetuosa solicitude, que um coração de pai possa conhecer”, afirmava ainda Pio IX em 1954, num discurso aos alunos católicos dos Estados Unidos. Da mesma forma, o Papa Leão XIII na oração que compôs “A vós São José” coloca a expressão “pelo amor paternal que tivestes com o Menino Jesus”.
Jesus foi verdadeiramente amado dentro de sua família, não sofreu o sofrimento psicológico de falta de afeto, e nem se sentiu um estranho, mas gozou de todas as vantagens dentro de sua virtuosa família.
O Papa Paulo VI ressalta sobretudo a caridade de  São José no fato que ele soube amar Jesus em sua família com a oferta da própria vida: “A vida  de José não teve outro sentido ou razão que aquela do serviço ao Menino, ao qual era confiada a Redenção. Ele colocou à disposição dos desígnios de Deus a sua liberdade, a sua legítima vocação humana, a sua felicidade conjugal, aceitando da  família a condição, a responsabilidade e o peso, e renunciando por um incomparável virgíneo amor, ao natural amor conjugal que a constitui e a  alimenta, para oferecer assim com sacrifício, toda a sua existência às imponderáveis exigências da vinda do Messias” (Allocuzione de 19/03/1969).
José foi, portanto pelo desígnio de Deus, o primeiro a reconhecer o Reino de Deus presente em Jesus e deixou tudo por ele, tornando-se assim o protagonista da parábola do tesouro escondido, o qual vendeu tudo o que possuía para comprá-lo. Ele é o comerciante de pedras preciosas, o qual descobrindo uma verdadeiramente preciosa, vende todas as pérolas para comprá-la. Para esta sua decisão foi necessário não apenas a graça da vocação, mas também a valorização desta levando-o a colocar Jesus acima de qualquer bem, assim como a sacrificar tudo para vivenciar esta vocação.
Paulo VI salienta como já lembramos, que José fez de sua vida um serviço, um sacrifício ao mistério da encarnação e à missão redentora e usou de sua autoridade legal, que tinha sobre a Sagrada Família, para fazer-se total dom de si, de sua vida e de  seu trabalho, assim como fez oblação de si, do seu coração e de todas as suas capacidades, no amor colocado ao serviço do Messias germinado dentro de sua casa. Portanto ele exercitou a sua autoridade de pai de modo verdadeiramente exemplar, tendo para com Jesus um amor sem limites e juntamente com Maria, na casa de Nazaré, exercitou o seu amor no seu grau mais perfeito, justamente porque o praticou para o próprio Deus na pessoa de Jesus, Verbo encarnado.
Os privilégios que o evangelista Mateus atribui aos discípulos de Jesus (Mt 13,11.16) pertencem a São José de modo especial e reforçando esta verdade, Pio IX e também Pio XI, interpretando em chave Josefina o relato do juízo final, onde Jesus dirá “vinde benditos do meu Pai, porque eu tive fome e me deste de comer..” (Mt 25,34-35), e então perplexos os bons dirão, “Senhor quando foi que te vimos com fome...” (Mt 25,37), afirmam que dentro desta maravilha José será aquele que não observará nada, será aquele que consentirá com aquele juízo dos justos a seu respeito porque ele fez tudo de bem para Jesus aqui na terra. Se os apóstolos ficaram cheios de alegria por aquilo que ouviram, viram com os próprios olhos, tocaram com as próprias mãos (1Jo 1,1), muito mais será a alegria de São José que no exercício de sua missão de pai de Jesus, bebê, criança, adolescente, jovem e adulto, quando vivenciou toda essa realidade. Por isso S. Bernardo diz: “O Senhor encontrou José segundo o seu coração e lhe confiou com plena segurança o mais misterioso segredo do seu coração. A ele desvelou a obscuridade e os segredos de sua sabedoria... aquilo que numerosos reis e profetas desejavam escutar e não ouviram, foi concedido a São José, que não apenas o viu e o ouviu, o abraçou, o beijou, o alimentou e dele cuidou” (Homilia Super  Missus est: PL 183,70).
O amor de José por Jesus foi portanto um amor sem reservas, foi um amor traduzido em generosidade, sacrifício, serviço, dom de todo a sua pessoa; um amor que só em Maria encontrou um modelo. Assim sendo, a pessoa de São José, a devoção a ele, é-nos um convite para amar Jesus com todo afeto do nosso coração, mas é também e sobretudo um convite ao serviço incondicional à vontade de Deus.
            A função educativa de José sobre Jesus é um aspecto de sua paternidade nem sempre lembrado.  A psicologia ensina que a pessoa recebe as influências do ambiente em que vive e das pessoas com as quais convive. Ciente desta verdade o Papa Paulo VI soube colher muito bem este aspecto, vendo refletido nas atitudes de Jesus a longa partilha de vida que ele teve com José na Carpintaria de Nazaré, e na sua família, juntamente com Maria. Por isso ele afirma: “São José é o tipo de evangelho que Jesus, ao deixar a pequena oficina de Nazaré, e ao iniciar a sua missão de profeta e de mestre, anunciará como programa para a redenção da humanidade” (Allocuzzione de 19/3/1969). Isto significa que o tipo de “homem novo” anunciado por Jesus, foi formado na sua mente humana durante os muitos anos em que passou ao lado de José, correspondendo àquele modelo concreto que ele sempre tinha diante de si.
É evidente que a contínua presença deste homem sério e virtuoso influiu positivamente em Jesus. O Verbo de Deus teve o conhecimento experimental dos valores de José e de Maria através desta convivência diária em sua família de Nazaré. José e Maria não podiam não ser para Jesus os modelos mais perfeitos, os quais ele os tinha como pais e que os aceitava como educadores e mestres para si.
São José foi, além do mais, o tipo humano que Jesus mesmo escolheu para qualificar a sua própria posição social de “Filho do Carpinteiro”. José fiel à sua missão na disposição de colaborador na encarnação do Filho de Deus, tornou-se assim, o “modelo dos humildes que o cristianismo eleva a grandes destinos. Ele é a prova de que para ser bons e autênticos seguidores de Cristo não se necessita de grandes coisas, mas bastam e acorrem virtudes comuns, humanas, simples, mas verdadeiras e autênticas”, como ainda afirma Paulo VI.
Enquanto foi Deus a escolher para a encarnação de seu Filho aqui na terra a família de José; foi José, contudo, que deu a Jesus “o estado civil, a categoria social, a condição econômica, a experiência  profissional, o ambiente familiar e a educação humana” (Allocuzzione de 19/3/1964).
Evidentemente que um homem do quilate de José não podia de maneira alguma, dentro da  experiência diária de vida e de trabalho entre Jesus e ele, e também com Maria, não trazer em decorrência disso, todas aquelas conseqüências benéficas de caráter psicológico, afetivo, intelectual, espiritual e moral, que Jesus tão bem soube exprimir no relacionamento com as pessoas durante a sua vida.
José neste sentido foi verdadeiramente o educador de Jesus, justamente porque ele tinha como pai, e em ordem à sua missão, a tarefa de educar Jesus para o trabalho e para as experiências da vida. Por isso, o grande teólogo Orígenes ao afirmar que “O Espírito Santo honrou São José com o título de pai”, justifica depois, sua afirmação de que José educou o Menino Jesus. E  Santo Tomás na mesma linha de Orígenes  reconhece que José, embora não tivesse gerado Jesus, merece todavia o título de pai por ter assumido todas as funções propriamente paternas. Justifica ainda mais, afirmando que o matrimônio de José  e Maria foi querido por Deus especialmente para isso, ou seja, porque neste Jesus fosse acolhido e educado. Como podemos concluir, a função de São José na encarnação e na redenção, segundo Santo Tomás, não é secundária, pois sua função foi muito mais do que ser o guardião de Jesus, não foi limitada a uma assistência externa, por isso  mesmo a Igreja sabiamente quis confiar a vida espiritual dos fiéis a este grande personagem dos desígnios de Deus.




Questões para o aprofundamento pessoal

1.    Indique como suas palavras o sentido da paternidade afetiva de José em relação a Jesus.
2.    Comente a afirmação de São Bernardo presente nesta lição onde explicita que São José era segundo o coração de Deus.
3.    Em que modos concretos José foi educador de Jesus?